VAMOS DIRETO AO PONTO
Quem vive há um tempo o alcoolismo sabe: não existe cura.
Nem milagre.
Nem promessa mágica.
Nem “toma isso que passa”.
Nem “é só força de vontade”.
O que existe é remissão.
É tratamento.
É responsabilidade diária.
É acordar e dizer:
“Hoje, eu não bebo.”
O alcoolista não adoece porque quer. Mas se mantém doente quando tenta enfrentar tudo calado. Assim, o álcool é o que aparece. O motivo real, contudo, fica escondido — às vezes por décadas.
VOCÊ NÃO BEBE POR GOSTAR. VOCÊ BEBE PARA NÃO SENTIR
O alcoolista não bebe apenas porque acha divertido. Não bebe porque é “social”. Não bebe só porque gosta do sabor. Bebe, principalmente, para anestesiar.
Para desligar a cabeça que não para.
Para empurrar a solidão para longe.
Para esquecer a vergonha.
Para adiar a dor.
Para parecer forte.
Para se sentir parte de algo.
O álcool não é o problema. É a saída encontrada. No entanto, ao buscar saída sem saber o caminho, pode-se ficar perdido em um labirinto.
A DEPENDÊNCIA É SINTOMA — NÃO DEFINIÇÃO
Dependência é um jeito de funcionamento que se repete porque foi a solução que você encontrou. Torta, perigosa, eficaz por cinco minutos — mas solução. A bebida vira muleta emocional. O corpo aprende. O cérebro se molda. A repetição vira compulsão.
E você começa a achar que: sem álcool não dá pra socializar, sem álcool não dá pra dormir, sem álcool não dá pra relaxar, sem álcool você é “menos”. Mas isso é mentira. É só hábito emocional reforçado por anos de fuga.
NÃO EXISTE CURA, MAS EXISTE RECONSTRUÇÃO
A medicina diz: sem cura.
A psicanálise diz: sem cura.
A vida mostra: sem cura, mas com reconstrução de vida.
O alcoolismo não desaparece. Mas você aprende a viver sem beber. Você aprende a lidar com o que antes te derrubava. Você aprende a se responsabilizar pelas suas escolhas. Você aprende a encarar seus medos sem anestesia.
É um processo. Demorado. Incômodo. Mas possível.
O PAPEL DA FALA: O QUE VOCÊ ESCONDEU VIRA O QUE VOCÊ BEBE
É simples: o que você não fala, você bebe.
Tudo que ficou entalado — insulto, abandono, rejeição, humilhação, medo, culpa — vira combustível para a recaída. É por isso que a fala importa tanto.
AA entendeu isso muito bem: gente falando, gente ouvindo, gente encontrando força no coletivo. Funciona. Ajuda. Salva. Mas ali o foco é o sintoma: o álcool.
É diferente quando você se senta num espaço individual e começa a falar de você. Da sua história. Do que te fez buscar anestesia. Do que você nunca contou a ninguém. Do que você pensa quando a recaída bate. Do que você odeia sentir. Do que você não deixa ninguém ver.
Ali você entende que o álcool não é o assunto principal da sua vida — é consequência. E, quando a raiz aparece, a garrafa perde poder.
FALAR NÃO TIRA O VÍCIO, MAS TIRA O PESO DO SOFRIMENTO
Falar não cura no sentido biológico do conceito. Falar não apaga o passado. Falar não clareia tudo de uma hora para outra.
Mas falar abre espaço. E, quando há espaço, você respira. Você entende. Você se escuta. Você percebe que não está condenado. Você descobre que pode reescrever sua história. Não apagando o alcoolismo — mas vivendo apesar dele.
O ALCOOLISTA NÃO É CULPADO PELO QUE FEZ, MAS…
Não se trata de culpa, mas de assumir a responsabilidade. Culpa só paralisa. Responsabilidade liberta. Você não escolheu ser dependente. Mas escolhe o que faz a partir disso. Por isso, a sobriedade é decisão diária; consciente, consistente e coerente. Repetida centenas de vezes, dia após dia, ano após ano.
Mesmo cansado. Mesmo sozinho. Mesmo com medo. É construir um futuro que não dependa de garrafas. E sim de você.
SE VOCÊ CALA, O ÁLCOOL FALA POR VOCÊ
O calar é perigoso. É no calar que a recaída começa. É no calar que o gatilho emocional cresce. É no silêncio que a vergonha domina. É na palavra não dita que o álcool se oferece como saída.
Falar não resolve tudo. Mas é onde tudo começa. Não existe cura. Mas existe vida. E vida de verdade, sem anestesia, é algo que você pode — e merece — construir. Não para ser “perfeito”. Mas para ser você, inteiro, presente, consciente.
A fala salva.
A fuga escraviza.
E você merece sair desse ciclo.
Rafa Pessato
Especialista em Autoconhecimento e Comportamento











